sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

O MUNDO INVISÍVEL DO TRÁFICO

                                    



                                                         
                                                                         Benedito Carvalho Filho
                                                                         Sociólogo, publicado
                                                                         No Jornal Pessoal, Belém-PA

O Jornal Pessoal nº 525, da segunda quinzena de novembro oferece aos seus leitores dados para refletir sobre a violência no país e na Amazônia. No ranking das 50 cidades mais violentas do mundo, segundo a pesquisa feita por uma organização não governamental do México chamada Conselho Cidadão para a Segurança Pública e Justiça Penal, Belém é a 10ª cidade mais violenta do mundo, entre as 50 relacionadas na pesquisa.
Logo em seguida, no mesmo número do JP, na página 3, temos duas longas páginas na matéria chamada “O mundo do crime no mundo da lei”, onde o jornalista tece longo comentário sobre o livro de Marina Magessi, Duro na queda, publicado pela Editora Objetiva. Trata-se de um relato dos 18 anos de uma pessoa que foi uma autoridade na polícia no Rio de Janeiro.
Ao concluir a leitura dessas duas matérias que o jornal ofereceu ao público não pude deixar de me fazer algumas interrogações:
Que relação existe, por exemplo, entre o fato de Belém ser a 10ª cidade mais violenta do mundo e o tráfico de droga, do qual o Rio de Janeiro, com suas favelas e seus líderes narcotraficantes, constitui o cenário mais visível? 
Por que a violência vem aumentando no Brasil e no mundo e que relação haverá entre esse crescimento e o aumento da corrupção, da lavagem de dinheiro, o tráfico de drogas, cada vez mais sintéticas e que movimentam milhões de dólares?
Por que a violência assustadora em São Paulo neste momento em que policiais e traficantes se confundem e nos faz ver que a luta não é entre mocinhos e bandidos, como quer nos fazer crer a política repressiva do governador do Estado, que recentemente viu cair seu Secretario de Segurança?
Por que o Brasil tornou-se o país de elevado consumo de cocaína e maconha? Por que a criminalidade dos potentes elegeu o Brasil – país que paga as taxas de juros mais elevadas do planeta – como lugar no qual o dinheiro é multiplicado?
Por que – e de que forma – o dinheiro dos poderosos, sem origem, vai para os paraísos fiscais e retorna para ser investido, em nome de empresas offshore?
Que mãos invisíveis no Brasil atuam nesse mundo invisível do narcotráfico e quais seus personagens, que raramente aparecem nas notícias da mídia nem nos inquéritos policiais?
Ao ler os livros de Argemiro Procópio, O Brasil no mundo das drogas (Editora Vozes, 1999) e de Alessandra Dino e Wálter Franganiello Maierovich chamado Novas tendências da criminalidade transnacional mafiosa, (Editora Unesp) chegaremos à dramática conclusão de que o que vemos e sabemos sobre esse mundo é quase nada. Talvez seja essa a razão de “ninguém se espantar, se indignar nem reagir”.
Não é possível se espantar e se indignar com aquilo que não se conhece e que não aparece nas telas da mídia e em matérias jornalísticas de outros veículos de informação para o grande público. O mundo das drogas é o mundo do silêncio, da cumplicidade, no qual saber muito pode custar a própria vida. É o quer acontece diariamente nas cidades amazônicas, como Belém e Manaus, onde todo dia são assassinados pequenos comerciantes de drogas, devedores nesse mercado subterrâneo, onde a vida não vale nada. 
Por trás da venda de drogas ao consumidor, que concentram os fabulosos capitais do narcotráfico, existe uma economia invisível, onde lucros fabulosos são lavados na economia formal, como nos mostra Argemiro Procópio no seu livro; onde a Amazônia (colombiana, peruana, boliviana e brasileira, ligadas à rede mundial) desempenha um papel fundamental. Uma parte vai para o “consumo doméstico” no país e outra é exportada para a Europa e para os Estados Unidos.
Mário Magalhães, no pequeno livro chamado Narcotráfico, publicado pela Publifolha, em 2000, revela os dados sobre a economia do narcotráfico no Brasil.
Diz ele:
“Foi na década de 90 que o Brasil se consolidou como o maior entreposto da droga enviada da Colômbia (fabricante de no mínimo 80% da produção mundial) para o EUA e a Europa. É o maior produtor de éter e acetona da América Latina. Essas substâncias são utilizadas na produção do cloridrato de cocaína, a dita ‘cocaína pura’”.
O governo da Colômbia afirma que 20% do fornecimento dos dois produtos químicos sai do Brasil. A fabricação de cocaiana em território brasileiro é muito pequena, apesar de haver plantação de epadu, uma variedade de coca, na Amazônia.
A única droga ilícita produzida em larga escala no território brasileiro é a maconha – diz ela. O resto vem de plantações no Paraguai. Cocaina, crak, heroína (em pouca quantidade), anfetaminas e metanfetaminas (como o ecstasy, droga sintética popular entre clubbers) provêm na quase totalidade do exterior.
Para Magalhães, como o narcotráfico se espalha subterraneamente, em organizações de caráter transnacional, multinacional do crime, é difícil saber com precisão muitos dados. Mas, citando dados da Justiça dos Estados Unidos, um procurador de lá afirma que o narcotráfico no Brasil fica com 5% a 10% do bolo mundial. Considerando os US$400 bilhões que o comércio de droga globalizado envolve por ano, de acordo com a ONU (Organização das Nações Unidas), a fatia nacional iria de US$ 20 bilhões a US$ 40 bilhões.
E faz a contabilidade:
“Com os US$ 20 bilhões (o equivalente a R$ 36 bilhões em maio de 2000), é possível comprar na planta 450 mil apartamentos de três quartos do Plano 100 em São Paulo, 2.320.185 carros Gol Special ou 270 milhões de cestas básicas na capital paulista”.
O espaço para comentar é pequeno. Esse tema levantado pelo JP é importantíssimo e mereceria estudos e debates mais aprofundados. O que o artigo constata é infinitamente pequeno. A Amazônia não é movida pela exportação de minério e o agronegócio. O comércio invisível das drogas movimenta o mercado informal da região, dá emprego para antigos e novos agricultores, com a decadência da agricultura no interior tornando-a cada vez mais inexpressiva.
Hoje, como diz Argemiro Procópio no seu livro, a economia do crime não é movimentado por marginais, mas por novos personagens, como mulheres, crianças e pessoas que jamais entrarão no mercado formal. Quem circula por Manaus sabe que um imenso número de pessoas sobrevive desse comércio. Não por acaso os shoppings centers vivem abarrotados de novos consumidores, mesmo aquele que não recebem bolsa família.

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