terça-feira, 14 de agosto de 2012

Manaus: o panorama visto por um professor paraense


                                                  Publicado no Jornal Pessoal
O texto a seguir é um depoimento do professor de geografia Áthila Kzan, que acaba de lançar um livro, A Amazônia Revelada, do qual sou co-autor. Ao saber que ele tinha acabado de voltar da Manaus, cidade que não visito há algum tempo, pedi-lhe que colocasse suas impressões em palavras. É para o belenense saber das coisas manauaras.
No último carnaval, como não gosto muito de folia, aproveitei para fugir da confusão carnavalesca e realizar um “passeio geográfico”: conhecer a capital amazonense. A escolha da cidade não foi aleatória, queria conhecer pessoalmente a capital que apresentou o maior ritmo de crescimento econômico da região Norte nas últimas décadas.
Apesar de a viagem ter sido relativamente curta e em um período sui generis, deu para ter uma noção da realidade manauara. Localizada na confluência dos rios Negro e Solimões, ela foi fundada em 1669 através da implantação do forte de São José do Rio Negro. Seu nome é uma homenagem à tribo indígena Manáos, do tronco linguístico aruaque que significa “Mãe de Deus”.
Ao chegar à cidade, o que de imediato chamou atenção foi à ponte de 3,5 km de extensão sobre o rio Negro orçada em mais de 1 bilhão de reais. Inaugurada no ano passado pela presidente Dilma Rousseff no aniversário da cidade, ela é a segunda maior ponte fluvial estaiada do planeta e a maior do Brasil, responsável pela ligação com a cidade de Iranduba (importante polo turístico em função dos pomposos hotéis de selva que apresenta). Ao lado do teatro Amazonas, maior símbolo da riqueza gerada pela borracha na Amazônia Ocidental no final do século XIX e início do XX, orgulha a população local.
A ponte ilustra o crescimento econômico da cidade, processo associado diretamente à implantação da Zona Franca, em 1967, que concedeu uma série de incentivos fiscais e creditícios para as empresas instaladas na região. Passados mais de 40 anos a cidade apresenta o sexto maior Produto Interno Bruto (PIB) e a sétima maior população do Brasil.
O distrito industrial abriga cerca de 600 empresas principalmente dos setores de motocicletas, televisão e informática. Juntas elas geram mais de 100 mil empregos diretos e apesar das reduções alfandegárias, o distrito recolheu 4 bilhões de reais ao estado em 2011.
Em razão desse dinamismo, Manaus se transformou em um polo de atração. Atualmente sua população é de 1,8 milhões de habitantes. Vale destacar que em 1960 o contingente demográfico, segundo o IBGE, não ultrapassava a casa dos 200 mil!
Ao chegar à cidade, o que de imediato chamou atenção foi à ponte de 3,5 km de extensão sobre o rio Negro orçada em mais de 1 bilhão de reais. Inaugurada no ano passado
A infraestrutura da cidade não acompanhou o crescimento demográfico, uma vez que os bairros periféricos, marcados por habitações precárias construídas sobre palafitas se desenvolveram em ritmo acelerado. De acordo com dados da secretaria de meio ambiente do estado são mais de 20 mil palafitas construídas sobre os igarapés. Melhorar o sistema de saneamento básico é um desafio nacional, mas na capital amazonense é uma tarefa mais árdua.
Outros problemas são observados como a criminalidade que atingiu níveis alarmantes. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública realizado pelo Ministério da Justiça no final de 2009, Manaus ocupou a sétima posição entre as capitais mais vulneráveis à violência juvenil, ficando a frente do Rio de Janeiro (8ª) e Belo Horizonte (17ª).
Geógrafo que se preze não se contenta em visitar apenas os tradicionais pontos turísticos de uma localidade. Fiz questão de conhecer a usina hidrelétrica de Balbina, no rio Uatumã, a 180 km da capital, no município vizinho de Presidente Figueiredo, bastante conhecido por suas cachoeiras.
Nos 100 primeiros quilômetros, o percurso foi realizado pela BR-174 (Manaus – Boa Vista) que liga a capital amazonense à Pacaraima (RR). A rodovia ao todo possui 974 km de extensão e atravessa reservas indígenas como dos Waiamiri-Atroari, além de um importante projeto de exploração mineral: Pitinga.
Construído durante a ditadura militar e asfaltado no governo de Fernando Henrique Cardoso, o eixo rodoviário surpreendeu pelo bom estado de conservação, apesar do restrito acostamento. A surpresa foi grande, pois estou falando do estado do ex-ministro dos transportes Alfredo Nascimento, afastado em 2011 acusado de irregularidades! Os outros 80 quilômetros foram realizados pela AM-240.
Ao chegar à hidrelétrica avistei o assombroso reservatório do empreendimento considerado um dos maiores desastres técnico- ambientais e sociais da história do país. O lago de mais de 2.300 km2 foi responsável pelo remanejamento de povos tradicionais, além de provocar a submersão de uma vasta área florestada e ser culpado de emissão anual de toneladas do principal gás causador do efeito estufa: o carbônico (CO2).
Apesar de a área alagada ser quase o dobro do registrado por Itaipu (1.350 km2), a usina amazonense não gera nem 5% do potencial da hidrelétrica do rio Paraná! Um verdadeiro absurdo! Ela não consegue fomentar a necessidade elétrica da Manaus que se vê obrigada a queimar petróleo em centrais termoelétricas.
Apesar dos problemas manauaras e dos municípios do entorno, o estado do Amazonas tem se esforçado nos últimos anos para superar o estigma que marcou o processo de ocupação da fronteira amazônica: o desflorestamento.

A criminalidade que atingiu níveis alarmantes. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública realizado pelo Ministério da Justiça no final de 2009, Manaus ocupou a sétima posição entre as capitais mais vulneráveis à violência juvenil, ficando a frente do Rio de Janeiro (8ª) e Belo Horizonte (17ª).

Em função da enorme concentração econômica e demográfica, o estado pode ensaiar um discurso de sustentabilidade, até pelo menos quando as frentes econômicas forem contidas.  Iniciativas voltadas ao ecoturismo, por exemplo, apontam a viabilidade da compatibilização do crescimento econômico, justiça social e proteção do meio ambiente.
De acordo com essa realidade visitei, após um agradável passeio no rio Negro, um parque chamado “Amazon Fish” que apresenta comida regional deliciosa, ótimo atendimento e íntimo contato com a natureza.
Um paraense, ao escrever um artigo sobre sua viagem à Manaus, não poderia deixar de comentar a rivalidade entre a população das duas cidades (isso cabe num novo texto!). A concorrência regional ganhou ares popularescos com a escolha de Manaus como sub-sede da Copa do Mundo de Futebol de 2014.
As obras da “Arena da Amazônia” no antigo Vivaldão, mesmo seguindo a lógica do atraso, típico das obras públicas brasileiras, já foram iniciadas. O problema maior virá quando o evento terminar (a cidade terá apenas a primeira fase). O que fazer com uma obra de R$ 580 milhões?
Abrigará um campeonato estadual de futebol, onde o jogo final recebe um público de apenas 3.000 pagantes! Será que vale a pena tanto investimento? Clube do Remo e Paysandu apresentaram média de público no último campeonato estadual de 13.600 e 5.271 respectivamente.
Na verdade, diferente do que muita gente apregoa, Belém não disputou vaga com a “rival”. A articulação política amazonense liderada pelo atual senador e ex-governador Eduardo Braga foi muito maior e enquanto no Pará for reinante a trilogia “desmatamento, conflitos agrários e prostituição”, a capital continuará sendo deixada de lado, em detrimento de cidades menores, como Cuiabá e Natal, que foram escolhidas pela FIFA (Federação Internacional de Futebol Associado).
Apesar da rivalidade, a recepção que tive em Manaus foi a melhor possível, tanto que a vontade de retornar persiste. Quem sabe em outros carnavais...(reproduzido do Jornal Pessoal nº 509, do jornalista paraense Lúcio Flávio Pinto).
     
Na verdade, diferente do que muita gente apregoa, Belém não disputou vaga com a “rival”. A articulação política amazonense liderada pelo atual senador e ex-governador Eduardo Braga foi muito maior e enquanto no Pará for reinante a trilogia “desmatamento, conflitos agrários e prostituição”, a capital continuará sendo deixada de lado, em detrimento de cidades menores, como Cuiabá e Natal, que foram escolhidas pela FIFA (Federação Internacional de Fute

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