terça-feira, 14 de agosto de 2012

UFAM, “NOSSO MAIOR PATRIMÔNIO”. SERÁ?


Benedito Carvalho Filho

Hoje, quando entramos no campus da Universidade, nos defrontamos com um portal onde está escrito: Universidade Federal do Amazonas, nosso maior patrimônio.
Certamente o leitor ao entrar nesse portal se perguntará: o que significa essa afirmação? Será o patrimônio físico, essa imensa área verde preservada onde está localizada a instituição? Será seu patrimônio imobiliário?
Certamente quem bolou essa frase não pensou somente nesses atributos físicos, mas nas pessoas que por ali passaram e estão passando, nos conhecimentos produzidos nas mais diversas áreas do saber e na importância que eles têm para a modernização da sociedade amazonense (e da Amazônia, de uma maneira geral).
Apesar de não ser consenso entre alguns intelectuais da terra, não podemos negar o papel desempenhado pela Universidade nesta região na difusão de conhecimentos e na propagação de valores modernos na sociedade local. Mesmo sabendo das imensas dificuldades que esta instituição enfrenta (e não são poucos) e dos questionamentos severos que muitas vezes se faz sobre ela (como dizer, por exemplo, que ela é um grande escolão) não podemos deixar de reconhecer a sua importância para a sociedade amazonense.
Apesar de tudo, foi nesse espaço institucional, que ainda pode ser considerado o “paraíso da classe média,” que se questionou (e vem se questionando, mesmo que com menos veemência e irreverência) o conservadorismo tão forte na sociedade local.  

Quando alguém ou alguma instituição invade a universidade, como aconteceu no longo período autoritário em que vivemos em nosso país, onde as forças reacionárias prendiam e ameaçam alunos e professores, isso significou uma violência brutal ao nosso patrimônio moral e intelectual.

Por isso, podemos dizer que as instituições universitárias no Brasil (algumas com maior visibilidade que outras) se constituem em espaços de rebeldia. Espaços plurais onde ocorrem  debates e a discussões. Esse é um dos seus grandes patrimônios que parece meio relegado nos tempos de hoje, mesmo vivendo nos tempos mais democráticos.
Mas não tão democráticos se observarmos o que vem acontecendo na Universidade de São Paulo (USP), a maior universidade do País, sob a governança de um reitor truculento chamado Grandino Rodas, conhecido no campus como “o rei”.  

A Universidade é lugar da liberdade de expressão, do conflito, do contraditório, do debate de idéias e não o patrimônio de certas elites encasteladas no poder, onde seus representantes fazem o que querem, como aconteceu no ano passado (2011), quando um professor da UFAM foi violentamente espancado em plena sala de aula.

Por aqui passaram figuras públicas, professores, jornalistas, publicitários, cientistas sociais, físicos, químicos, engenheiros e pessoas das mais diversas profissões que compõe o que se chama a “classe média” da cidade. Alguns com idéias de esquerda, outros conservadores e indiferentes, mas todos, invariavelmente, viveram (e vivem) e respiraram o clima cultural que se vive dentro da universidade, porque ela era (e ainda é) um dos únicos meios de aprendizado não só de uma profissão, mas de exercício da cidadania.
 Seu valor simbólico é inquestionável. Não sem razão as famílias de todas as classes sociais desejam que seus filhos e filhas entrem nesse “portal” chamado “Universidade”, como bem entronizou o nosso Martinho da Vila na sua canção.
Mas, diferentemente do passado, onde entrar na universidade era um desafio para poucos, hoje boa parte dos alunos está nas faculdades e universidades privadas.
A universidade se massificou e perdeu a qualidade, como nos mostra o professor do Instituto de Física da USP, Otaviano Helene, no artigo que escreveu para a revista Carta Capital, nº 688 de março de 2012. Com isso a enorme maioria de nossos estudantes apresenta graves problemas em praticamente todas as áreas do conhecimento, o que frequentemente provém da falta de efetivo entendimento de um texto simples.
Isso abala profundamente a credibilidade de nosso patrimônio e é um grave problema que merece discussão.
 Mas, mesmo com todos esses problemas, cursar a universidade é visto pela maioria da sociedade brasileira como um caminho de ascensão. É poder participar no chamado mercado de bens simbólicos; é estar em contato com a produção da cultura e ter possibilidade – muitas vezes a única – de ascender socialmente em uma sociedade com reduzidas chances de mobilidade social, como é a realidade socioeconômica do amazonense.
Esse patrimônio hoje se encontra diante de graves dificuldades, (ler artigo abaixo) como se sabe. Mas não se pode negar a sua importância. Temos que trabalhar com o que existe e com o que temos, o que não é pouco.
Outro problema é sua autonomia. Não há como preservar o espaço universitário se não existir autonomia universitária. Por isso, quando alguém ou alguma instituição invade a universidade, como aconteceu no longo período autoritário em que vivemos em nosso país, onde as forças reacionárias prendiam e ameaçam alunos e professores, isso significou uma violência brutal ao nosso patrimônio moral e intelectual.


Mas para atravessar esse portal nos tempos de hoje as dificuldades são monstruosamente grandes

A Universidade é lugar da liberdade de expressão, do conflito, do contraditório, do debate de idéias e não o patrimônio de certas elites encasteladas no poder, onde seus representantes fazem o que querem, como aconteceu no ano passado (2011), quando um professor da UFAM foi violentamente espancado em plena sala de aula.
O nosso maior patrimônio, conforme está escrito no dístico do portal, passa a ser violado quando isso ocorre.
Não podemos esquecer que no passado ela foi um dos poucos espaços de contestação e teve (e tem) um inegável papel na modernização da sociedade, enquanto elaboradora de novos códigos de comportamentos e valores e influenciou fortemente a moral e os costumes da região. Não é por acaso que hoje e universidade tem uma expressiva presença feminina espalhadas por todos os cursos, inclusive aqueles que eram considerados masculinos. São mulheres que buscam novas maneiras de se colocar e perceber o mundo.
É esse o patrimônio que desejamos preservar. É o portal que temos que atravessar!
Mas para atravessar esse portal nos tempos de hoje as dificuldades são monstruosamente grandes. No artigo seguinte a filósofa Marilena Chauí nos mostra os desafios que temos que enfrentar no ensino universitário. É oportuno nesse momento a leitura da entrevista da professora concedida à Revista do Brasil.
Leia e discuta.

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