terça-feira, 14 de agosto de 2012

NOTAS PARA PENSAR A PSICANÁLISE E A DECONSTRUÇÃO SUJEITO

INTRODUÇÃO

                       Benedito José de Carvalho Filho

Você acredita que, quando pensamos e agimos, somos movidos pela nossa própria vontade e seguimos os ditames de nossa própria consciência? Somos seres racionais e conscientes de nossos atos? Quando falamos em subjetividade, o que realmente queremos dizer? Como surgiu a idéia de que somos senhores de nossos atos, ou seja, sujeitos de nossa própria vontade?
São estas as perguntas que procuramos responder nesse artigo, estabelecendo um diálogo com a filosofia e a psicanálise e seus rebatimentos em outros campos do saber, como a Sociologia, a Antropologia e a Psicologia Social.
Considero essa discussão importante no campo das chamadas ciências humanas por várias razões. Em primeiro lugar é comum encontrarmos reflexões que se fundamentam em conceitos como subjetividade, identidade, representações e outras categorias, cujas implicações teóricas e metodológicas nem sempre aparecem muitas claras. Afinal, o que estamos entendendo quando nos referirmos a essas categorias? Quais os fundamentos epistemológicos quando usamos esses conceitos? Fala-se em representações da velhice, do louco, das mulheres de determinadas categorias sociais, dos efeitos provocados pela globalização na sociabilidade pós-moderna, com suas rupturas, seus “desencaixes”, nas novas formas de subjetivação, etc.
Evidentemente esses conceitos e categorias de pensamento têm desdobramentos teóricos e epistemológicos diferentes nesses diversos campos. Por isso começarei as minhas reflexões por uma questão que considero importante: a concepção de sujeito.
É fundamental discutir isso porque a modernidade foi modelada pela ética kantiana, que, como veremos fundamenta a idéia de uma razão centrada no indivíduo, na consciência como portadora de uma vontade, ou seja, numa ética e concepção do que seja um cidadão. Isso passa a ser questionado pela psicanálise, primeiramente por Freud e, posteriormente, por Lacan e terá fortes implicações não só na maneira de perceber o indivíduo na clínica, mas também o laço social, com todas as suas implicações.
O percurso das reflexões que apresento neste artigo será buscar uma maior compreensão do que se entende por subjetividade e observar como se configura o entendimento do que seja o sujeito, destacando como essa categoria foi trabalhada pelo pensamento cartesiano, onde Descarte (1596-1650) (percebia o homem como plenamente soberano de sua atividade racional. Ou seja, esse sujeito cartesiano que tem sua interioridade como o núcleo que constitui a sua subjetividade  muitas vezes aparece como sendo a- social, a- histórica porque seu detentor é um sujeito plenipotente, graças à racionalidade.
Sabe-se que o conceito de identidade possui uma longa tradição filosófica e significou a permanência em meio à mudança, a unidade em meio à diversidade e esteve fortemente ligada à ascensão do individualismo. Existiria uma essência na determinação do que a pessoa é? Fala-se comumente na essência do ser humano, na minha essência. Existiria uma essência preservada, mesmo em meio à mudança? O que é o indivíduo? Ele possui uma unidade, mesmo em meio à diversidade?
Como é possível perceber, a categoria identidade é polêmica e sujeita a múltiplas interpretações, dependendo da ótica que se adota.
Representações, uma categoria cunhada inicialmente por Durkheim e muito empregada hoje na Psicologia Social por Moscovici, são analisadas como fenômenos mentais compartilhados pelos quais as pessoas organizam suas vidas. Como define Scott, são crenças, idéias, valores, símbolos e perspectivas formadoras dos modos de pensamentos e sentimentos gerais e permanentes numa sociedade ou grupo social ou individualmente e compartilhados coletivamente.  [1]
Como é concebido o sujeito quando trabalhamos com esses conceitos? O que ocorre quando um entrevistado conta sua história de vida? Quem é esse sujeito que fala? Fala de que posição? Como consideramos os não ditos, os silêncios, os atos falhos e as defesas tão presentes em uma entrevista? O sujeito que fala é amo e senhor do que fala?
Como vemos o conhecimento psicanalítico pode contribuir com o pesquisador, na medida em que permite considerar (e desconfiar) que o sujeito que fala não é soberano daquilo que está falando, imaginando, por exemplo, que aquilo que ouve tem uma objetividade, um significado em si mesmo, como se a sua verdade fosse transparente. O conhecimento do sujeito torna-se, nesse sentido, importante para o pesquisador e instrumento de conhecimento que não se atém no do que é dito, porque compreende que há algo mais que se esconde na aparente objetividade da fala. Afinal, como lembrava Freud, o homem não é senhor em sua própria casa.  

SUBJETIVIDADE VISTA DA ÓTICA DA FILOSOFIA

A palavra subjetivo (adjetivo) adquire significados diferenciados. No Dicionário do Aurélio Buarque de Holanda,[2] encontramos o adjetivo subjetivação compreendido como ato o efeito de subjetivar, caracterizado como uma qualidade ou caráter de subjetivo, palavra que vem do latim subjectivu, com as seguintes conotações:

a)  Relativo ao sujeito; b) existente no sujeito; c) individual, pessoal, particular;
d) passando unicamente no espírito de uma pessoa; e) válido para um sujeito; f) que pertence ao pensamento humano, em oposição ao mundo físico, isto é, a natureza empírica dos objetos a que se refere; g) aquilo que é subjetivo.

Ou seja, a subjetividade, as formas de subjetivação fazem parte da interioridade o ser humano, que se opõe, como afirma, ao mundo físico, a natureza empírica dos objetos. É parte da condição humana e está relacionada a algo inerentemente pessoal, que passa unicamente no espírito da pessoa, sendo uma característica singular do ser humano, pois ele, diferentemente de outras criaturas e seres, é o único capaz de imaginar, poetizar, sonhar, ou como diria Winnicott,[3] de brincar com a realidade, pois é um ser imaginoso, capaz de recriar o mundo, ir além do mundo concreto e empírico onde ser encontra imerso. 
Percebe-se que essa conotação expressa no dicionário do Aurélio se encontra bem próxima do chamado subjetivismo, cuja tendência é tende a reduzir toda a existência do pensamento em geral ao idealismo e solipsismo. Assim, o subjetivismo, observa o autor, reduz a doutrina segundo o qual a distinção do bem e do mal tem como raiz quer o bem estar ou sofrimento individual quer as emoções pessoais de aprovação ou desaprovação; ou ainda, teoria segundo a qual os julgamentos estéticos exprimem gostos individuais.
Vejamos como um filósofo [4] conceitua a subjetividade:
Para ele, a subjetividade vai estar marcada por três aspectos:

1.              O caráter de todos os fenômenos da consciência que o sujeito relaciona a si mesmo e chama “meus”;
2.              Caráter do que é subjetivo, no sentido de ser aparente, ilusório ou falível. Neste sentido Hegel situava na esfera da subjetividade o “dever ser” em geral, bem como os interesses e as metas do indivíduo.
3.              Subjetivo é aquilo que pertence ao sujeito ou tem o caráter se subjetividade.

O autor vai mostrar que o significado de subjetivo como pertencente ao seu eu ou ao sujeito do homem é encontrado pela primeira vez em alguns escritores alemães do século XVIII. Refere-se à fé considerada subjetivamente, que é um conjunto de crenças.
A beleza ou a verdade seriam objetivas ou subjetivas?
Segundo ele, entendia-se por objetiva uma propriedade dos objetos, e por subjetivas uma representação da relação entre as coisas e nós, ou seja, uma relação com o pensamento. Foi por ai que Kant extraiu o novo significado atribuído ao substantivo sujeito.
Partindo das considerações do autor, percebo que as discussões vão girar em torno de duas concepções bastante diferenciadas. Os conteúdos subjetivos são originados no sujeito individualizado, onde o universal não é algo real, ou existe na subjetividade algo mediando a realidade? A primeira concepção desemboca no idealismo e a segunda no materialismo histórico.
Não é sem razão que na modernidade, como observa o autor, o subjetivismo designa a doutrina que reduz a realidade ou valores a atos do sujeito. Nesse sentido, o idealismo é subjetivo porque reduz a realidade das coisas a estados do sujeito (percepção ou representação). Analogamente, fala-se de subjetivismo moral, subjetivismo estético, onde o belo e o feio são reduzidos às preferências individuais.
O materialismo histórico, pelo contrário, a produção de idéias, de representações, de consciência está desde o início, diretamente entrelaçada com a atividade da vida real. O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens aparece aqui como emanação direta do seu comportamento material.[5]

              SUJEITO E CONSCIÊNCIA E O PENSAMENTO MODERNO

A questão do sujeito e sua subjetividade, como vimos resumidamente, é uma discussão filosófica bem antiga e supõe um melhor aprofundamento, o que não é a intenção desse trabalho. Penso, no entanto, que as questões postas aqui já permitem pensar em alguns problemas que envolvem as nossas reflexões no campo da sociologia, pois essas concepções, de uma forma ou de outra, têm conseqüências diretas nos aspectos teóricos e metodológicos de uma pesquisa, principalmente quando trabalhamos com os conceitos que envolvem a subjetividade, identidade e representações.
Por isso considerei importante discutir nesse momento como essas questões aparecem no mundo moderno, principalmente porque a sociológica é um saber que se edificou também dentro desses pressupostos filosóficos, ou seja, como uma reflexão crítica dessa modernidade.
Chauí nos mostra como a discussão sobre a subjetividade vai tomar corpo e suas várias conotações nesse momento, onde o conceito de sujeito vai estar associado à idéia de interioridade e essencialidade, como já foi possível perceber
A idéia (ou crença) na existência de uma essência, que marcaria o ser humano faz parte da tradição ocidental e é originária da chamada filosofia da consciência.
O ser humano, segundo essa concepção, é constituído de um núcleo autônomo, racional, consciente e unificado no qual se localiza a origem e o centro da ação humana.
Na modernidade, portanto, a concepção de sujeito, o eu é que determina e condiciona toda a atividade consciente e, assim, desenvolve-se toda uma reflexividade antropológica caracterizada pelo pressuposto de que somos seres racionais, conscientes, ou seja, dotado de consciência, capaz de conhecer as coisas.
Como afirma Chauí,

 a consciência é a capacidade humana de conhecer, para saber que conhece. A consciência é um conhecimento (das coisas) e um conhecimento desse conhecimento.
(...) é o sentimento de nossa própria identidade; é o eu um fluxo temporal de estados corporais e mentais, que retém o passado na memória, percebe o presente pela atenção e espera o futuro pela imaginação e pelo pensamento. O eu é o centro ou a unidade de todos os estados psíquicos e é formado pelas nossas vivências, isto é, pela maneira como sentimos e compreendemos o que se passa em nosso corpo e no mundo que nos rodeia, assim como o que se passa em nosso interior. É a maneira individual e própria com que cada um de nós percebe, imagina, lembra, opina, deseja, age, ama, odeia, sente prazer e dor, toma posição diante das coisas e dos outros, decide, se sente feliz ou infeliz.

Na modernidade a consciência é

 a espontaneidade livre e racional, para escolher, deliberar e agir conforme a liberdade aos direitos alheios e ao dever. É a pessoa dotada de vontade livre e de responsabilidade. É a capacidade para compreender e interpretar sua situação e sua condição (física, mental, social, cultural, histórica), viver na companhia dos outros segundo as normas e os valores morais definidos por sua sociedade, agir tendo em vista fins escolhidos por deliberação e decisão, realizar as virtudes e, quando necessário, contrapor-se aos valores estabelecidos em nome dos outros, considerados mais adequados à liberdade e à responsabilidade.

A partir desses pressupostos, onde o eu é concebido como portador de uma vontade consciente, que encontra em si mesmo o princípio de suas ações, que, do ponto de vista político, encontramos a idéia de cidadão.
Esse cidadão, ainda segundo Chauí,

é tanto o indivíduo situado no tecido das relações sociais,  o portador de direitos e deveres, relaciona-se com a esfera pública do poder e das leis, enquanto membros definidos por uma classe, portador e defensor de direitos específicos de seu grupo ou de sua classe, relacionando-se com a esfera pública do poder e das leis.

Nesse sentido,
a consciência é uma atividade sensível e intelectual, dotada de poder de análise e síntese e representação. Reconhece-se como diferente dos objetos, cria e descobre significações, institui sentidos, elabora conceitos, idéias, juízos e teorias. É dotada da capacidade de conhecer-se a si mesmo no ato de conhecimento, ou seja, é capaz de reflexão. É saber de si e saber sobre o mundo, manifestando-se como sujeito percebedor, imaginante, memorioso, falante e pensante. É o entendimento propriamente dito. [6]

São essas as características da tese kantiana, que privilegia a representação da lei moral, tendo como único móvel a vontade. A vontade santa, como dizia Kant, onde a santidade nasce da renúncia à perversão, o que está fora da razão e, por isso, é desqualificado. Logo o princípio racional é o único móvel legítimo de uma vontade autônoma. O prazer é eliminado do horizonte, pois, segundo essa percepção, mina a liberdade e a responsabilidade.

Mas que acontecerá se o sujeito do conhecimento descobrir que a consciência possui mais um grau? (...) Se descobrir que há algo mais que ela desconhece e sobre a qual nunca poderá refletir diretamente? Que esse algo, desconhecido ou só indiretamente conhecido, determina tudo quanto a consciência e o sujeito sentem, querem, fazem, dizem e pensam? (...) O que sucederá quando o sujeito do conhecimento descobrir os limites intransponível chamado inconsciente? [7]

             A DESCONSTRUÇÃO DO SUJEITO PELO OLHAR DA PSICANÁLISE

Compreender a subjetividade contemporânea significa aceitar, como faz a sociologia, que a idéia de sujeito tal como foi formulada tempos atrás se encontra numa profunda crise. O sujeito kantiano se encontra num processo de degradação, decomposição, como diz Touraine,[8] pois


ele fragmentou-se rapidamente em múltiplas realidades (...) revelando um eu fragilizado, mutante, submisso a todas as publicidades, a todas as propagandas e às imagens da cultura de massa. O indivíduo não passa então de uma tela sobre a qual se projetam desejos, necessidades, mundo imaginários fabricados pelas novas indústrias de transformações. Esta imagem do indivíduo, que já não é mais definido por grupo de pertenças, que é cada vez mais enfraquecido e que não encontra mais um princípio de unidade é obscuramente dirigido por aquilo que escapa à sua consciência, serviu muitas vezes para definir a modernidade.

A transparência de um sujeito como almejava a filosofia kantiana recebeu seu mais forte abalo no campo da psicanálise e isso vou demonstrar de forma sintética neste capítulo onde estabeleço um diálogo com alguns de seus principais expoentes da psicanálise, principalmente com Freud e Lacan.
Penso que compreender o sujeito hoje com todas as ambivalências a que se referiu o sociólogo francês citada acima, significa, antes de tudo, pensar o sujeito tendo como referência uma teoria que esvazie esse sujeito cartesiano, logocêntrico, que marcou a modernidade. Trata-se de uma tarefa difícil para todos nós que nascemos e nos criamos numa cultura marcada pelo iluminismo, ou seja, pela crença na razão como componente importante da essência do homem. Difícil, também, porque estamos impregnados pela velha psicologia da identidade, ou de uma concepção de linguagem como veículo dócil e transparente, onde as palavras e as coisas, como dizia Foucault, parecem corresponder. [9]

Freud e a revolução coperniciana

O sujeito, numa perspectiva não logocêntrica, ganha seu relevo com Freud e, posteriormente, com Lacan, na medida em que foram os dois, em épocas distintas, que se empenharem em minar o campo das certezas que a modernidade construiu. Certezas cartesianas e pós cartesianas reveladas pelo que Lacan denominou de revolução copérnica de Freud.[10]  
Depois dessa revolução, qualquer filosofia que ignore o inconsciente mostra-se, no mínimo, insatisfatória. Como dizia Lacan:

Para pensar o sujeito, a via filosófica teria bastado, mas mostrou-se insuficiente por falta de uma definição suficiente do inconsciente. [11]

Freud chamou esse inconsciente de sinistro, o unheimlich, [12]depois de ler os contos de Hoffman.[13] um conceito fundamental da Literatura Fantástica que Freud chamou das Unheimlich. O equivalente inglês é the Uncanny, que o dicionário Webster traduz como o “estranho, misterioso; sinistro; excepcional, incomum; fantástico, sobrenatural; perigoso”.
Mike Ashley (The Encyclopedia of Fantasy, ed. John Clute & John Grant), explica:
Embora usado com freqüência para descrever qualquer coisa estranha ou inusual, o sentido estrito da palavra se refere a algo além do nosso conhecimento, além do nosso alcance, portanto não é necessariamente algo sobrenatural. Decidi recorrer pessoalmente ao Dr. Freud. Em seu artigo clássico sobre o tema ele diz que o Unheimlich/Uncanny não deriva seu terror de alguma coisa externa, estranha ou desconhecida, mas, pelo contrário, de algo estranhamente familiar, que tentamos afastar de nós, mas que resiste aos nossos esforços.

Enfim, sinistras são as nossas estranhas sensações de algo que muitas vezes está tão perto de nós e que nos causam inquietações. Isso porque esse unheimlich, como afirma Chnaiderman, não é uma certeza intelectual, não é da ordem do saber e daí a necessidade de assumirmos que “somos muitos carnavais” e infindáveis processos de criação de signos, não havendo significados últimos.[14]
Freud é incisivo quando diz:

A psicanálise propõe mostrar que o Eu não somente não é senhor na sua própria casa, mas também está reduzido a contentar-se com informações raras e fragmentadas daquilo que se passa fora da consciência, no restante da vida psíquica (...) A divisão do psíquico num psíquico consciente e num psíquico inconsciente constitui a premissa fundamental da psicanálise, sem a qual ela seria incapaz de compreender os processos patológicos, tão freqüentes quanto graves, da vida psíquica e fazê-los entrar no quadro da ciência (...). A psicanálise se recusa a considerar a consciência como constituindo uma essência da vida psíquica, mas nela vê apenas uma qualidade desta, podendo coexistir com outras qualidades e até mesmo faltar. [15]

Freud foi o maior desbravador do inconsciente, subvertendo a idéia da existência de um sujeito autocentrado. Foi ele que nos mostrou que todos os nossos pensamentos, lembranças atuais e passadas estão ligadas por meio de conexões e nada ocorre por acaso, mas são determinados pelo inconsciente que possui a sua linguagem e suas formas próprias de manifestações, como os sonhos, chistes e os atos falhos. Para ele, o que chamamos de inconsciente é uma pequena parte da mente, sendo a maior parte inconsciente, onde estão os princípios determinantes da personalidade, as pulsões e os instintos.
Como afirma Mezan:

É proverbial o desprezo com que Freud encara a Filosofia e os filósofos. Inúmeras são as passagens em que satiriza a pretensão ao saber absoluto, o dogmatismo e a indiferença pela investigação empírica que, no seu entender, constituem as marcas registradas da Filosofia. Reprova-lhe, sobretudo a teimosia de reduzir o psiquismo à consciência, furtando-se assim a possibilidade de penetrar na verdade do seu objeto por excelência, o homem; e não lhe perdoa a ambição de construir concepções universais com os magros elementos da imaginação do filósofo, sem levar em conta os resultados de seu trabalho.[16]

Lendo Freud, Lacan enfatizou com audácia a noção de sujeito à luz de um saber que, de certa forma, ultrapassa o próprio psicanalista vienense. Para ele não se trata de buscar a verdade profunda do indivíduo, como faz a chamada psicologia do ego, que, segundo ele, se transformou no que chamou de human engineering, uma prática onde o analista procura modelar o paciente normalizando-o. Ele chama isso de cacofonia teórica em um dos seus seminários.[17]
É nessa direção, portanto, que Lacan, com seu estilo de escrever e falar (pois muitas de suas idéias foram pronunciadas nos seus famosos seminários em Paris) vai tecer violentas críticas à psicanálise americana, que até hoje não conseguiu se desvencilhar de uma prática onde o eu não só assume o lugar central, mas é reforçado, pois deu ênfase só a instância do ego, produzindo desvio teórico com graves conseqüências para a prática psicanalítica. Uma psicanálise adaptativa, integradora, desviando a tópica freudiana das três instâncias (o ego, id e superego), reduzindo o sujeito ao ego e a prática analítica à identidade progressiva do ego do paciente com a do analista, que só se ocupa das defesas a vencer e só escuta o desejo a suprimir.  
Neste tipo de terapia o analista se torna aquele que sabe e a análise se torna uma luta de prestígio, um exercício de poder. Tomar-se como aquele que sabe é o risco que todo analista corre, mas, sobretudo a armadilha na qual não se deve cair, pois se já sabe a priori já não está na posição de vir a saber, descobrir a verdade conforme o procedimento ordinário de Freud, ficando a análise reduzida a uma análise das identificações imaginárias e a história do sujeito ao aqui e agora da sessão analítica.
Não foi por acaso que Lacan se insurgiu contra a chamada Escola Inglesa de Psicanálise, [18] fazendo críticas tanto a que se filiou a Anna Freud,[19] quanto a Melanie Klein e aos que fizeram uma espécie de fenomenologia, escamoteando o objeto da descoberta, como, por exemplo, Daniel Lagache ( 1903-1972)  na França. [20]
Mas, quando Lacan se refere a essa tendência de domesticar a psicanálise ele está se referindo ao seu interlocutor maior, Hartmann.
Ele foi uma das expressões do pensamento psicanalítico americano e influenciou alguns membros da famosa Escola de Frankfurt.[21]
No seu clássico livro de 1930, Psicologia do Ego e o problema da adaptação,[22] defende a existência de um ego autônomo em relação ao id. Para ele, uma análise bem sucedida é a que leva o sujeito a ser produtivo, capaz de gozar a vida e ser feliz, sendo que essa adaptação é um relacionamento recíproco entre o ambiente e o indivíduo. Trata-se, portanto, de um processo de adaptação, onde se considera o ambiente normal. O papel do psicanalista do ego é ajustar esse indivíduo nesse ambiente.
Ainda segundo Hartmann, a ênfase anterior que dava grande peso e importância aos impulsos era um erro, desenvolvendo a idéia de que existe um aparato mental inato que se desenvolve independente do id, que ele denominou de ego autônomo.
Na psicanálise americana Hartmann teve muitos seguidores, inclusive Piaget (1896 -1980) o epistemólogo suíço, considerado o maior expoente do estudo do desenvolvimento cognitivo foi influenciado por essa tendência. A idéia de um ego forte e ego fraco é proveniente desta matriz teórica. Para ele, que diz ter se inspirado em Freud, um ego é forte quando pode aceitar o id lidar com a realidade e confrontar o superego. É fraco na medida em que o ego fracassa em qualquer destes requisitos. Aí o indivíduo torna-se doente, empenha-se em comportamentos repetitivos, autodestrutivos ou mal adaptativo. [23]
As idéias citadas acima caíram como uma luva numa sociedade individualista e liberal, como a norte-americana, onde a idéia de felicidade, de sucesso e ascensão social está associada ao indivíduo competitivo e a uma personalidade narcísica. A idéia de um ego-autocentrado com justificativa burguesa era bem apropriada para estabelecer o ideal de estabilidade, criando o super-homem americano, segundo a expressão utilizada por Cesarotto. Era como se os analistas (com seus super-egos) se oferecessem ao ianque para guiá-lo até o happiness, através do amercan way.[24]
Os autores americanos, no final da década de 1990, apesar de mais sofisticados teoricamente, não deixam de privilegiar o ego como fonte de comportamento. Os chamados (ironicamente) de narcisistas de Chicago caminharam nessa direção, sendo o mais representativo deles um psicanalista nascido em Viena, Heinz Khout, professor de psiquiatria da Universidade de Chicago e autor de uma obra muito divulgada no Brasil na época chamada, A análise do Self. [25]
O importante é ressaltar a recusa dos críticos lacanianos em adotar uma perspectiva que dê ênfase a uma epistemologia que acentue a autonomia e a necessidade de um ego forte, ou (como alguns dizem) de um ego-higienizado.
Mesmo os que não são psicanalistas com Sennet, (1943....) preferem aceitar a idéia do eu como um quebra-cabeça, um problema de difícil solução.

O grande ideal terapêutico de Freud – diz ele – foi que ele não tratou de higienizar o eu. Durante toda a sua vida teve que aceitar o quebra cabeça de seu próprio eu e esta aceitação tem o mesmo significado de uma cura que a pessoa deve uma falta de satisfação como conseqüência de um anelo a ser satisfeito, aceitar o processo hermenêutico da psique como uma espécie de resignação. Resignação não é desespero. Ao abandonar o intento de clarificar o eu o indivíduo pode entrar nas relações sociais que estão ao seu alcance com uma sensação de alívio. Para dizer de outro modo, as possibilidades civilizadas da vida social não descansam num sonho utópico de que a dominação social terminará, mas em proporcionar um domínio que ofereça alguma escapatória da calamidade que consiste a atividade psíquica.[26]
Alaganier (1923-1990) vê esse eu como um eterno aprendiz de historiador (...) que, sem cessar, opõe suas construções, mais ou menos frágeis, a esse mestre burro que é o id que, como toda a tranqüilidade repete uma história sem palavras que nenhum discurso poderá modificar. [27]
Neste livro a autora discorre como se dá os processos identificatórios, sintetizadas em parte por Vera Blondina Zimmerman, em seu trabalho clínico que penso ser muito oportuno para o nosso propósito, que é discutir a questão da identidade. Reproduzo aqui somente um pequeno fragmento de seu trabalho para compreendermos o que Alaganier chama de aprendiz de historiador, que, na verdade, é o percurso de como se dá o processo de identificação e como ele ocorre ao longo de nossa existência.  

O primeiro capítulo da história do sujeito, em que ele recebe significações, será o mote sobre o qual desenvolverá sua própria história, tentando metabolizar o recebido e superar essa experiência de ser possuído por um outro. Será no discurso das figuras parentais que o Eu encontrará seus primeiros enunciados identificatórios: termos que nomeiam o afeto e termos que designam os elementos do sistema de parentesco para uma dada cultura. O sujeito se apropria destes enunciados e seus efeitos serão posteriormente produzidos, ou seja, o Eu investirá sobre este alicerce.
Portanto, o sujeito necessita ter sido pré-investido libidinalmente pelas figuras parentais que lhe transmitem uma série de enunciados identificatórios, designando-lhe, a partir disso, um lugar futuro. Esta autora entende, que “o Eu é um historiador e sua historização depende do processo identificatório.”  E este, por sua vez, está ligado ao passado, mas também sempre pode ser reelaborado por meio de um trabalho no presente, com participação do social agindo no intrapsíquico.
Aulagnier denomina Projeto Identificatório, os “enunciados sucessivos pelos quais o sujeito define (para si e para os outros) seu anseio identificatório, ou seja, seu ideal”. Segundo ela, o projeto designa “a resposta que o sujeito forja para si, cada vez que se pergunta o que ele é (ou, quem é "eu"). 
O momento inicial do projeto identificatório do Eu, segundo Aulagnier, precede a dissolução do complexo de Édipo e caracteriza-se pela dependência da idealização dos primeiros objetos, esperando tornar-se a resposta do que ele acredita ser o desejo materno. Já está implicado na temporalidade, mas ligada ao ideal materno.
O segundo momento do projeto identificatório, apesar do sujeito já estar ancorado no ‘ter’, passa a ‘ser’. Os objetos do passado são reencontrados e a idéia é: “Quando eu crescer, eu me tornarei aquilo que eu fui”.
A mãe, ao interditar o desejo incestuoso pelo filho, protege a si e a criança, confrontando-a com a castração, com os limites de seu poder, com sua sujeição ao desejo do pai e à lei. Assim, o filho investe no futuro, ou seja, abandona o desejo edípico substituindo-o pelo projeto identificatório do Eu. Portanto, o projeto identificatório é uma espécie de troca do drama edípico pelos anseios identificatórios de um ideal para o Eu.
Assim, passa a predominar no sujeito a angústia de castração ou angústia de identificação, ou seja, o Eu passa a temer perder suas referências identificatórias. A partir desse momento da identificação simbólica, as perguntas que o sujeito se faz sobre si mesmo já não são respondidas pelo outro, mas sim pelo próprio Eu, a partir da projeção de um estado e de um ser que ele foi no passado. Porém, é preciso que ele aceite a diferença entre o que é e o que queria ser, projetando para o futuro este encontro ilusório; entre o Eu futuro e o Eu atual tem de haver uma diferença que representa a prova da castração no registro identificatório, prova que deve deixar intacta a esperança narcisista do encontro futuro entre eles.
Dessa forma, “Eu constituído”, segundo Aulagnier, é um Eu capaz de assumir a experiência de castração, conseqüentemente, a renúncia ao atributo da certeza, o que significa: espera tornar-se uma imagem valorizada por ele e pelo meio, ou por um subgrupo que valoriza. A esperança de vir a ser esta imagem também é fundamental neste processo que culmina com o fim da constituição do Eu.
A castração, para esta autora, constitui-se para o sujeito como:
[...] a descoberta, no registro identificatório, de que não ocupamos jamais o lugar que acreditávamos nosso e que inversamente já estávamos destinados a ocupar um lugar no qual não poderíamos ainda nos encontrar. 
Ainda, sintetizando, nas palavras desta mesma autora, os dois tempos do projeto identificatório manifestam-se assim:
“Enquanto nos mantemos no período que precede a prova da castração e a dissolução do complexo de Édipo, os pontos suspensos remetem a fórmulas que podem ser resumidas assim: a) casarei com mamãe; b) terei todos os objetos que existem. Na fase posterior, o enunciado será completado por um... serei isto (médico, advogado, padre, aposentado). Qualquer que seja o termo, que nunca é indiferente, o importante é que deverá designar uma qualidade possível e, sobretudo e antes de tudo, uma qualidade com um sistema de parentesco a que pertence o sujeito.” 
Fala-se, portanto, da construção de uma imagem ideal que o Eu se propõe a si mesmo. Esta imagem pode aparecer num futuro como imagem do reflexo daquela imagem que lhe foi dada em espelho na identificação especular. Para que o Eu se constituisse como um Eu ideal narcisicamente investido foi preciso que tivesse a estabilidade dessas duas referências: que são o seu reconhecimento e o reconhecimento de si mesmo pelo olhar dos outros.
Ao abandonar este tipo de busca de satisfação presente por meio da dissolução do Édipo, esta imagem ideal não será mais produto do desejo de um outro Eu apenas. A partir daí, sempre haverá uma diferença entre o Eu futuro e o Eu presente, em que predomina a esperança narcísica de um auto-encontro, sempre postergado, entre o Eu e seu ideal.
Neste percurso, segundo Aulagnier, o Eu atual necessita ter esperança de vir a ser a imagem identificatória valorizada pelo sujeito e pelo meio, ou por um subgrupo cujos modelos são privilegiados pelo sujeito.
Nestes movimentos subjetivantes, a temporalidade e a memória, peças fundamentais do processo identificatório, são regidas pelos princípios de permanência e mudança. Em suas palavras:
Mas, poderíamos igualmente bem, afirmar que o Eu é esse compromisso que nos permite reconhecer-nos como elemento de um conjunto e como ser singular, como efeito de uma história que de longe nos precedeu e como autor daquela que nossa vida conta, como morto futuro e como vivo capaz de não levar em conta demais aquilo que sabe sobre esse fim. O sujeito necessita manter um conjunto de elementos que fazem a base da história libidinal e identificatória do Eu, mas “não levar em conta demais”, para que possa ir efetuando mudanças, deixando que o quebra-cabeça identificatório vá absorvendo novos encaminhamentos para sua figuração futura.
Se o sujeito alcançar o “tempo de concluir” no final da infância, as escolhas que o social lhe desafia e cobra para que as faça no tempo presente ficarão menos difíceis e conflituosas. Aulagnier fala sobre os trabalhos psíquicos que devem ocorrer nesta etapa:
[...] o termo adolescente remete ao mesmo tempo a um passado e a um futuro, e dentre as tarefas reorganizadoras da adolescência, uma é determinante para o êxito ou o fracasso dessa reorganização: a tarefa de historizar e memorizar um passado que já está perdido, mas que, graças a este trabalho, pode continuar existindo psiquicamente.
 Essa “autobiografia” jamais é acabada, mas a construção e a reconstrução do passado vivido é condição necessária para que seja possível investir no presente e no futuro. Os elementos representacionais que constituíram as bases da biografia do sujeito, apropriados durante a infância, precisam estar fazendo nexo com o presente, para que ele não se sinta estranho a si mesmo. Um “capital fantasmático”, pelo qual o sujeito decide aproveitar ou rejeitar, de acordo com seu desejo. Dessa forma ele tem condições de eleger seus objetos de desejo.
No “tempo de concluir”, ao final da infância, instala-se em definitivo um tipo de “escolha”, a menos que na infância já tenha eclodido o autismo ou uma psicose. Caberá ao Eu prosseguir nas relações entre ele e a realidade, seus desejos e os dos outros, entre seus ideais e o que ele pensa ser, agora sem a dependência parental.
São momentos que dependem da constituição dos mecanismos repressores e da capacidade elaborativa da psique. Também é necessário que tenha ocorrido um duplo investimento, tanto do sujeito como de suas figuras parentais: ele sabe que sua história é uma história de relações e que foi feita em colaboração com outros, mas esses outros precisam ajudá-lo a apropriar-se dos elementos biográficos, ou melhor, da forma como viveu e sentiu essa caminhada, o que significa estar em acordo com sua memória.
Para Aulagnier, uma forma de risco na organização psíquica pode ser quando: as peças do construtor (sujeito) estão aparentemente encaixadas, mas ele não reconhece na construção o modelo que deveria ser construído. Essa forma de conflito identificatório, Aulagnier localiza na potencialidade polimorfa, onde o conflito é misto, no interior do Eu e entre o Eu e seus ideais. Esse tipo de saída para o Eu manifesta-se nas perversões, nos quadros de somatização e toxicomania. Em 1986, ela acrescenta outras manifestações da potencialidade polimorfa certas formas de anorexia e adicção e estados-limite. 
Os sujeitos, nesse último tipo de potencialidade, visam modificar a realidade de tal forma que ela seja responsável pelo sofrimento que o Eu padece; qualquer mudança no quebra-cabeça é inaceitável, pois ameaça o desencaixe de peças centrais. Resta ao construtor a possibilidade de fazer de conta que os elementos se equivalem, por meio do uso de mecanismos de ilusão, de distorção.[28]


Mc Dougall,[29] usando uma imagem poética de Shakespeare, prefere considerar esse Eu como
um ator no palco do mundo, que, sozinho, em sua realidade interna, assiste um teatro mais íntimo, cujo repertório é secreto. À sua revelia, os cenários se organizam para cenas bufas e trágicas, e que buscam um local para representações e ação. O diretor é, naturalmente, o Eu mesmo, mas os rostos dos personagens, a intriga, bem como o desfecho lhe são escondidos; ele não sabe, com efeito, quem são as pessoas que o carregam para o drama. Nenhum aviso lhe é dado de que a ação vai começar e de que, em algum lugar, num local de sua psique um personagem se deseja entrar em cena. E, no entanto, é lá nesse universo interior, quem decidirá a maior parte do que acontecerá em sua vida. [30]

O que chamamos de Eu é para a psicanálise, como para a lingüística, um significante vazio. É alienado que, como disse Dougall, carrega um drama sem saber, como Édipo. Isso porque sua existência depende do Outro.
Mas, pergunta Lacan:
A que necessidade interior responde o fato de dizer que deve haver em algum canto um automus ego?

Essa convicção – afirma – ultrapassa a ingenuidade individual do sujeito que acredita em si, que acredita que ele é ele – loucura bastante comum e que não é loucura total, pois faz parte da ordem das crenças. Evidentemente, temos tido a tendência a acreditar que somos nós mesmos. Não estamos tão seguros, observem bem de perto. Em muitas circunstâncias, bem precisas, duvidamos disso, sem sofrer despersonalização. Logo é mais uma crença ingênua que querem trazer de volta. Trata-se propriamente falando, de um fenômeno sociológico que diz respeito a análise como técnica, ou, se preferirem, como cerimonial, sacerdócio determinado num contexto social.  


[1] SCOTT, John (org.). Sociologia: conceitos chaves. Editora Zahar, p. 175. 2009- Rio de Janeiro.
[2] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário da Língua Portuguesa. Editora Positivo, Curitiba, 2008.

 

[3] WINNICOTT, Donald Wood. Brincar e realidade.  Editora:  Imago Edição: 1ª edição Ano: 1975. São Paulo, 1975.



 







[4] ABBAGNANO, Nicola. Dicionário Filosófico. Editora Martins Fontes, São Paulo, 1998.
[5] MARX , Karl & ENGELS, Frederich. A ideologia Alemã. Editora Boitempo Editorial, 2007. São Paulo, p.34-35.
[6] CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. Editora Ática. 2004,  São Paulo. Páginas 201-204.
[7] CHAUÍ, Marilena, op.cit. p. 167
[8] TOURAINE, Alain. Um novo paradigma – para compreender o mundo de hoje. Editora Vozes, 2º edição, Petrópolis, Rio de Janeiro, 2006, p. 119.
[9] FOUCAULT, M. As palavras de as coisas - uma arqueologia das ciências humanas. 8° ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
[10] A revolução a que se refere Lacan foi a descoberta de que a Terra não estava no centro do Universo e que os homens não eram o centro do mundo. A segunda foi causada por Darwin, ao provar que os homens descendem de um primata, que são apenas um elo na evolução das espécies e não seres especiais, criados por Deus para dominar a natureza. A terceira foi causada pelo próprio Freud com a psicanálise, ao mostrar que a consciência é a menor parte e a mais fraca de nossa vida psíquica.
[11] LACAN, J. Os quatro conceitos fundamentais de psicanálise. Seminário XI – Zahar Editor, Rio de Janeiro
[12] Estranho / Sinistro / Inquietante estranhamento (Unheimlich), in FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 1980.
[13] Ernst Theodor Amadeus Wilhelm Hoffmann (1776 -1822) foi um escritor, compositor, caricaturista e pintor alemão. É um dos maiores nomes da literatura fantástica mundial.
[14] CHNAIDERMAN, Miriam. Ensaios de psicanálise e semiótica. São Paulo: Escuta, 1989.

[15] FREUD, Sigmund. Cinco lições de psicanálise, discurso pronunciada por ocasião das comemorações do vigésimo aniversário da Fundação da Clark University, Worcester, Massachusetts, em setembro de 1909 e publicado  na coleção Os Pensadores, Abril Cultural, 1974, págs. 11 a 44) Tradução de Durval Marcondes e J. Barbosa, revista e modificada por Jayme Salomão

[16]MEZAN, Renato. Freud, a trama dos conceitos. Editora Perspectiva, São Paulo, 2001, p. XI.
[17] LACAN, J. O eu na teoria de Freud e na técnica da psicanálise, Zahar Editor, p. 18, Rio de Janeiro. Neste Seminário Lacan faz uma crítica à psicanálise nos Estados Unidos que estaria trilhando outro descaminho, concentrando-se na instância do ego para moldar o sujeito, transformando-se numa forma de exercício de poder, numa prática de human engineering, alvo principal da crítica que aciona o ensino lacaniano, cujo propósito é o de reencontrar o sentido da obra freudiana e indica de forma clara as posições teórico-práticas a que ele fará oposição.
[18]  A fundadora da Escola Inglesa foi Melanie Klein que seria considerada uma inovadora. Trabalhou com crianças e pacientes psicóticos. Tornou-se importante no movimento psicanalítico, revisando alguns conceitos da teoria freudiana, fundando então a Escola Inglesa de Psicanálise. Ainda dentro da escola inglesa, é importante dar destaque para grandes mestres como Wilfred Bion (1897-1979), e Donald Winnicott (1896-1971).

[19] Anna Freud, filha e seguidora de Freud, formadora de discípulos formou a escola da psicologia do ego. As principais escolas são: Escola Inglesa (M.Klein, Bion, Winnicott); Escola Francesa (Lacan); Psicologia do Ego (Anna Freud); Escola do Self (H. Khout).
[20] Lagache participou, com Jacques Lacan, à fundação da Sociedade francesa de psicanálise em 1953 e, dez anos mais tarde, na criação da Associação psicanalítica da França , da qual foi o primeiro presidente. No seu ensino, Daniel Lagache abordou diferentes domínios da psicologia, mostrando-se um professor constantemente preocupado com síntese, na ótica de sua notável lição inaugural sobre A Unidade da psicologia , psicologia experimental e psicologia clínica (1949). Mas a sua obra é essencialmente psicopatológica. Antes de tudo de inspiração fenomenológica, ela retoma de maneira abundante as concepções de Karl Jaspers,, em particular na sua tese de medicina, As Alucinações verbais e a palavra (tese de medicina, 1934) e na tese de letras O Ciúme amoroso (2 volumes, 1947).

[21] Essa é uma escola de pensamento desenvolvida no âmbito do marxismo, e começou na Universidade de Frankfurt, na década de 1920. Sob de Max Horkheimer, seus membros incluíam Theodor Adorno, Erich Froomm, Herbert Marcuse. O objetivo era desenvolver uma abordagem do marxismo que, devendo muito a Hegel, atribuía mais ênfase à política e à cultura do que o marxismo ortodoxo. Seus principais líderes trabalharam nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial, muitos retornaram a Frankfurt na década de 1950. No período do pós-guerra, quando essa abordagem teórica ficou conhecida como teoria crítica, Jurgen Habermas seu principal pensador. Sua obra baseia-se bastante tanto no estrutural-funcionalismo quanto na hermenêutica, e é uma teoria propositalmente sintética que, para alguns, tem pouca conexão com o marxismo. (Ver Scott, John. Sociologia, Conceitos Chaves, Zahar Editor, Rio de Janeiro, 2010). Uma história da Escola de Frankfurt mais detalhada por ser encontrada in Wiggershaus, Rolf. A Escola de Frankfurt-história, desenvolvimento teórico, significação política. Editora Difel, tradução do alemã por Lilyane Deroche, Rio de Janeiro, 2010.
[22] Hartmann. Heinz Psicologia do ego e o problema da adaptação, editora Bup, Rio de Janeiro. ano: n/d
[23] As idéias de Hartmann estão sintetizadas no livro de FINE, Ruben in História da Psicanálise, Editora LTC, Edusp, São Paulo, p. 264.
[24] SOUSA, Márcio & CESAROTO, Oscar. Jacques Lacan, uma biografia intelectual. Editora  Iluminuras, São Paulo, p. 52.
[25]Heinz Kohut, Psiquiatra e psicólogo austríaco, nasceu a 5 de março de 1913, na cidade de Viena, Áustria,e morreu a 10 de agosto de 1981, em Chicago, Estados Unidos da América.Foi o fundador de uma escola de psicanálise: a Escola da Psicologia do Self onde se dá um destaque importante à patologia dos transtornos narcisistas. Formou-se em Medicina na Universidade de Viena em 1938 e desenvolveu posteriormente o seu trabalho nos Estados Unidos da América, para onde foi forçado a emigrar e fugir dos nazis em 1939, pelo facto de ser judeu. Viveu o resto da sua vida em Chicago, onde deu aulas de Psiquiatria e Psicanálise na Universidade. Mudou de neurologia para psiquiatria e finalmente para psicanálise como ponto central das suas pesquisas. Estudou no Instituto de Psicanálise de Chicago e tornou-se a figura central da psicanálise americana, vindo a ser presidente da Associação Americana de Psicanálise em 1964/65 e o vice-presidente da Associação Internacional de Psicanálise, de 1965 a 1973.
Criou duas novas estruturas em relação ao self, ambas de formação arcaica: o self grandioso e o imago parental idealizado. Kohut via a psicologia do self como uma extensão da psicanálise e lutou contra a ideia de se tornar um movimento separado desta.A psicologia do self foi fruto do trabalho pioneiro de Kohut com pacientes que sofriam de distúrbios narcísicos, os quais demonstravam um sentimento indefinido de depressão ou insatisfação que conduzia a uma forte vulnerabilidade de autoestima e a uma extrema sensibilidade às ofensas por parte dos outros, juntamente com uma preocupação excessiva pelo corpo e falta de empatia pelo próximo. Esta falta de autoestima teria como causa uma carência de respostas empáticas na primeira fase do desenvolvimento precoce. Kohut desdramatizava a importância do papel das vicissitudes das defesas e condutas e do complexo do Édipo como sendo as causas primeiras das patologias. No seu lugar enfatizava o papel da falha de uma empatia precoce e a importância do narcisismo como uma linha de separação do desenvolvimento.A terapia proposta por Kohut centra-se na reconstrução do self fragmentado. Para Kohut, o objetivo da psicanálise é ajudar o paciente a desembaraçar-se dos objetos arcaicos e a desenvolver um self coeso que possa complementar um desenvolvimento mental saudável. As suas obras mais importantes são: The Analysis of the Self (1971), The Restoration of the Self (1977) e o livro publicado postumamente How Does Analysis Cure? (1984).
[26] SENNET, Richard. Narcisismo y cultura moderna. Editora Kairós, 1980. É autor vastas obras, muitas delas conhecidas no Brasil, como La cultura del nuevo capitalismo. Barcelona: Editorial Anagrama. 2006; El respeto. Sobre la dignidad del hombre en un mundo de desigualdad. Barcelona: Editorial Anagrama. 2003 El declive del hombre público. Barcelona: Península. 2002 Vida urbana e identidad personal. Barcelona: Ediciones Península. 2001; La corrosión del carácter. Las consecuencias personales del trabajo en el nuevo capitalismo. Barcelona: Editorial Anagrama. 2006 (Primera edición: 1999); Carne y piedra. El cuerpo y la ciudad en la civilización occidental. Madrid: Alianza. 1997
Autoridad. London: Faber & Faber. 1993; La conciencia del ojo. Barcelona: Ediciones Versal. 1992;
Narcisismo y cultura moderna. Barcelona: Kairos. 1980
[27] AULAGNIER, Piera. O aprendiz de historiador e o mestre feiticeiro – do discurso identificante ao discurso delirante, Editora Escuta, São Paulo, 1ª edição, 1999. A autora é uma psiquiatra e psicanalista francesa, de origem milanesa. Viveu no Egito durante a Segunda Guerra Mundial, antes de estudar medicina em Roma. Instalou-se em Paris, onde fez sua análise didática com Jacques Lacan. Participou da fundação da École Freudienne de Paris (EFP), que deixaria em 1969, em razão da discordância sobre o passe, para criar em 1969, com François Perrier e Jean Valebrega, a organização Psicanalítica de Língua Francesa (OPLF), também chamada Quarto Grupo. Especialista em clínica das psicoses e representante da terceira geração francesa, fundou a revista Tropique. Publicou os seguintes livros: La violence de I’Interpretation, Paris, 1975 (traduzido para o português) e a obra citada aqui. (Ver ROUDINESCO, Elizabet & PLOTON, Michel. Dicionário de Psicanálise, Zahar Editor, 1998, Rio de Janeiro).
[28] ZIMMERMANN, Vera Blondina. Os transtornos na constituição psíquica: seus efeitos no corpo e no processo de alfabetização. Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica-Núcleo de Psicanálise e Entre a Clinica e a Escola- Um lugar para Adolescentes “Estados-Limites. São Paulo, PUC, Tese de Doutorado em Psicologia Clinica, 2004.
[28] MC, DOUGAL, Joyce. Teatros do eu. Editora Francisco Alves, São Paulo, p. 10, 1996. [28] Neozelandesa radicada na França, desde os anos 50, é reconhecida internacionalmente por ser uma psicanalista de casos “difíceis” e investigar temas da clínica contemporânea. Autora de seis livros, traduzidos para cerca de dez idiomas, vários capítulos de livros, diversos artigos e conferencista internacional. As obras de Joyce McDougall foram traduzidas para o português, excetuando sua última obra sobre Winnicott, de 2003, e são listadas a seguir: Diálogo com Sammy (com Serge Lebovic) (1960) [Tradução brasileira realizada em 2001]; Em defesa de uma certa anormalidade. Teoria e clínica psicanalítica (1978). [Tradução brasileira realizada em 1991];Teatros do Eu (1982). [Tradução brasileira realizada em 1992]; Teatros do corpo. O psicossoma em psicanálise (1989). [Tradução brasileira realizada em 1991]; As múltiplas faces de Eros. Uma exploração psicanalítica da sexualidade (1995) [Tradução brasileira realizada em 1997]; Donald Winnicott the man: reflections and recollections (2003).




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